sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

O futuro negro das pequenas oficinas

Estaremos acabados? Estaremos nós, pequenas oficinas independentes, condenados a desaparecer com o tempo e diluídos na voraz força da modernidade?
O Professos Zózimo da Fonseca, numa entrevista ao site Auto Profissional, tem uma opinião arrepiante sobre o futuro das pequenas oficinas:

ENTREVISTA
JORGE ZÓZIMO DA FONSECA
Professor universitário do ISEL
"Muitas oficinas encerraram e provavelmente continuarão a encerrar"

Que perspectivas se levantam, por força da evolução das novas motorizações no sector automóvel?
As novas motorizações, híbridas e eléctricas, não apresentam mais complexidade que as actuais, creio, até, que será inferior. O motor de combustão interna, em termos de funcionamento, tem mais peças que qualquer uma das novas motorizações – tanto a eléctrica como a de hidrogénio. Todos os técnicos formados, das várias marcas, são obrigados a ter uma forte noção de electrónica, pelo que são mais mecatrónicos que mecânicos. Para além do aspecto psicológico de não ouvir o barulho do motor, não vejo dificuldades especiais em transitar para as novas motorizações, as quais não são muito diferentes em termos de desafio tecnológico.

Esta transição que advoga decorrerá no curto/médio prazo, ou ainda assistiremos durante mais algum tempo ao domínio dos motores de combustão interna?
As últimas informações que nós temos, e que vemos nos fóruns internacionais, é que o motor de combustão interna ainda terá alguma força. Temos a parte dos pesados e dos veículos de mercadorias, os quais estimo que ainda funcionem com motores de combustão interna durante mais 20, 30 anos. As novas motorizações dependem de aspectos políticos, respeitantes às redes de distribuição. Se houver redes de distribuição e com preços mais baratos, as pessoas optam por andar a eléctrico ou a hidrogénio. Se não, as pessoas têm que se manter com a actual, de combustíveis líquidos.

Nos dois últimos anos têm encerrado muitas oficinas por todo o país. Sente-se uma selecção natural, em que apenas as mais aptas se mantêm em funcionamento. Como têm estas enfrentado o período de crise?

Muitas oficinas encerraram e provavelmente continuarão a encerrar. As mais pequenas viviam da espontaneidade de um ou dois mecânicos e do arranjo de carros tecnologicamente pouco evoluídos, efectuando pequenas intervenções, as revisões, que são, na generalidade dos casos, simples. Mas, se pensarmos em algumas marcas ou num carro topo de gama, mudar uma pastilha de um travão pode ser um pesadelo para quem não tem a ferramenta – ou seja, não a muda.
As oficinas chamadas independentes têm dois caminhos: agrupam-se debaixo de uma bandeira qualquer ou, se mantiverem isoladas, vão desaparecer no tempo, caso o mercado continue a evoluir tecnologicamente como até agora. E digo que vão desaparecer no tempo porque não têm a capacidade de intervenção tecnológica nas viaturas. Terão que possuir equipamento, informação e formação. Enquanto houver automóveis de há 15, 20 anos a circular, vão-se mantendo mas com menos trabalho. A partir de determinada altura, mesmo com a confiança dos clientes, torna-se virtualmente impossível. E mesmo que queiram tirar cursos e evoluir, o problema é que depois já não há avarias intermédias, só pequenas – contactos ou cabos mal postos – ou então avarias complexas. As avarias intermédias, que resultavam das viaturas terem pontos frágeis – os famosos platinados, carburadores, sistemas de refrigeração, etc. –, desapareceram. As intervenções mais de fundo, essas, nitidamente, as oficinas independentes não têm capacidade de o fazer.